sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Entrevista com Celso Martins

Celso Martins
Foto: Diego Wendhausen Passos

Data da entrevista: 11/07/2010

Diego: Nas últimas eleições, tornou-se muito comum alianças entre partidos políticos de ideologias diferentes, como o antigo PL com o PT, do PPS com o DEM, deixando de lado os ideais defendidos pelas agremiações. O que tem motivado esses acordos nesses anos, principalmente depois da chegada petista ao poder federal?

Celso: Essas alianças, elas são até naturais que ocorram, inclusive entre agremiações que, se não tem no programa questões em comum, possuem adversários em comum. Os próprios programas, eles norteiam de um modo geral, a atividade político-parlamentar, mas acaba prevalecendo, na hora de uma votação, de uma tomada de posição, acabam prevalecendo, na maior parte dos casos, a vontade da pessoa, do indivíduo. Em raras exceções, existem decisões coletivas em torno de alguma causa, de alguma bandeira. Elas são sempre eventuais e pontuais. PSDB e PT, por exemplo, que encarnam as duas siglas, que polarizam hoje o processo eleitoral, em plano nacional. Se fizer uma boa pesquisa, vai se encontrar em alguns municípios, alianças entre tucanos e petistas, mas em função de uma realidade local que força essa aliança, e isso torna o programa partidário. Eu vejo, com exceção do PT, que na verdade nasceu do movimento social e procura representá-lo. A própria elite nacional não tem um partido que se diga, esse é o partido da elite, ou esses dois são os partidos da elite nacional, como nós temos em vários países da América Latina, em que dominam os conservadores ou os liberais, como havia no império brasileiro, a elite econômica, política, e mesmo intelectual, que na verdade, eles trabalham com esses dois elementos opostos, dois programas ou interesses opostos, porque existem setores importantes das elites nacionais, do empresariado, de lideranças empresariais que estão apoiando o PT, assim como existem outros, também importantes, apoiando o PSDB, apoiando o Serra, falando em plano nacional, então, esse me parece ser o fator motivador principal.

Diego: Após muitas movimentações, ameaças de intervenções dos diretórios federais nos estados, algumas coligações desagradaram inclusive integrantes das principais associações partidárias, podendo causar mudanças no quadro eleitoral. O que você considera que necessita mudar no atual sistema político?

Celso: Eu não sei. O próprio sistema político que está aí, acho que precisaria reformulado. Não se trata de pensar alguma mudança dentro do sistema político, o que é muito difícil, que nesse modelo dominante, as grandes questões nacionais que possam ser solucionadas. Eu acho que o sistema parlamentar de representação, da democracia representativa parlamentar, que está sendo colocado em xeque, e por vários movimentos sociais, na prática, e não se vê, não se acompanha uma resposta a altura, ao contrário. Questões ambientais, na questão do meio ambiente, do uso dos recursos naturais e da ocupação do solo, o próprio governo, as próprias estruturas do parlamento, o executivo tem procurado no possível, e respaldado, as alterações na área ambiental. Teve aqui em Santa Catarina, o novo código ambiental, que, de certa forma, estimulou essas modificações que querem fazer no código florestal. Vemos aqui, em Santa Catarina, neste momento, a tentativa de instalação desse estaleiro na Baía Norte, que segundo estudos, com a vinda do empreendimento, vão, dentro dois anos, extinguir as atividades de pesca e de maricultura na Baía Norte, e o que se vê hoje, são todas as lideranças partidárias, de todas as agremiações, a favor da instalação, em detrimento da questão ambiental, sob a alegação de que vai gerar emprego, vai gerar alguns mil empregos lá, mas vai desestabilizar todas as comunidades do entorno da Baía Norte, e isso eles não estão levando em conta, ou por ignorância, ou por má fé, e isso me preocupa. Não tem nenhuma voz, de nenhum dos candidatos ao governo do estado, fazendo qualquer questionamento na área ambiental, ao contrário, estão vendo investimento de milhões, que vão gerar empregos e sub-empregos, e o restante? E as comunidades do entorno? E o impacto social e urbanístico na Grande Florianópolis e em Biguaçu, o que isso vai provocar? Isso ninguém está vendo. Então, acredito que esse tipo de representação, que deveria ser a vanguarda das inovações, do planejamento, do pensar, do futuro, da cidade, das pessoas, isso está falhando. Alguma coisa vai ter que ser feita, alguma iniciativa vai ter que ser tomada para que se altere esse quadro, por que hoje, o que se tem, é um atira a primeira pedra e os outros todos atiram também. O meio ambiente não é uma questão de bandeira de modismo, é de qualidade de vida, e vai ser alterado. Imagina essas comunidades em torno da ilha, daqui a dois anos sem pesca? O que vai acontecer nestas comunidades? Isso me preocupa. Só complementando, as nossas elites de pessoas, que até um bom tempo atrás, conseguiram montar e executar um projeto de Brasil, um projeto de futuro, do Brasil, estão falhando, nesse caso. Estão falhando, e eu me questiono da capacidade desse sistema, que está hoje, de dar conta dessa enorme demanda que a sociedade coloca.

Nenhum comentário:

Postar um comentário