quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Entrevista com Marize Lippel

Marize conta sobre como era a realidade florianopolitana, os acontecimentos e as questões em torno da democriacia atual
Marize Lippel
Foto: Diego Wendhausen Passos


Data da entrevista: 19/05/2009


Diego: Como era a cidade na época?
Marize: Florianópolis era uma cidade tipicamente constituída do setor público, e principalmente as manifestações que eram originadas, na época, do movimento estudantil. Ele tinha uma grande parcela e contribuía como um movimento reivindicatório, tanto ligados a movimentos nacionais, como locais. Era através do movimento estudantil que a classe manifestava. Afinal, estávamos vindo de uma época de Ditadura Militar, as manifestações eram proibidas e acabou se criando uma cultura do silêncio. Ela era exercida plenamente pelo poder local, em que a grande maioria da população de Florianópolis, assim como do país inteiro. Falando em Florianópolis, como era uma cidade constituída principalmente de servidores públicos e estudantes, vindos da Universidade Federal de Santa Catarina e da estadual, mas principalmente da Federal, tinha essa característica bem típica, bem própria, porque era uma cidade bem pequena.

Diego: No ano de 1979 tivemos vários mudanças, o começo do governo Figueiredo, a anistia política, o fim do bipartidarismo e o surgimento de novas siglas como PT, PDT, a reintegração do PTB, e a Novembrada, que foi o episódio que começou, foi praticamente o começo do fim da ditadura. Como foi aquele período, como vocês se organizaram? Foram só os sete estudantes ou teve muito mais gente envolvida?

Marize: Na verdade a organização partidária ela existiu depois, naquele momento mesmo éramos os estudantes, mas cada um já tinha as próprias ideologias, já se constituíam com suas filosofias, direcionando-se para os futuros partidos políticos. Então, dentro do movimento estudantil já tinha essa divisão bem clara, cada linha específica já era originada da filosofia das agremiações partidárias até então.

Diego: E como foi o episódio, o Figueiredo sendo xingado, querendo partir para a briga com os manifestantes?

Marize: O episódio em si ele não se destaca por um só foco, ele é muito mais amplo. A manifestação decorreu de uma forma pacífica, inicialmente, que era para ser assim, em que os movimentos organizados, declaravam seu repúdio a atual situação que o país vivia, inflação, final da ditadura militar e o período de repressão que viviam as pessoas frente a todas as dificuldades sociais, aos grandes problemas dessa inflação galopante que a população vivia. Então ele não é um movimento focal, ele existiu, era a vontade do Diretório Central dos Estudantes de se manifestar. Na vinda do gestor maior da nação, que é o presidente da república, sobre a situação que o país vivia. A transformação desse movimento pacífico em uma manifestação desordenada, descontrolada, no qual houveram alguns tumultos, ela se deu também pela irresponsabilidade dos gestores. Hoje eu me considero adulta, e, tanto pelo presidente da república, como do governador local, que não souberam contornar o problema. Em momento algum conseguimos visualizar as pessoas que estavam envolvidas em toda a manifestação como pessoas responsáveis, que sabiam exatamente qual era o seu papel na hora de um tumulto. Então, em decorrência disso, é que realmente houveram os acontecimentos. Eu tenho certeza absoluta, cada vez mais, até por que estava presente na manifestação em frente ao palácio do governo, visualizando todas as manifestações gesticuladas corporalmente pelo presidente da república, então na época o presidente Figueiredo, e do próprio governador do estado de Santa Catarina, na época o Jorge Bornhausen, e a postura deles foi a pior possível. Uma postura realmente de pessoas que não têm nenhuma disciplina para poder agir em um momento como esse.

Diego: E os sete presos, eles foram escolhidos pelo próprio governador?

Marize: Na verdade os sete presos nada mais eram do que líderes estudantis, lideravam movimentos que existiam na sociedade. Todos participavam do movimento comum em prol das eleições democráticas, favorável à anistia nacional, movimento da anistia internacional, e da reconstrução da União Nacional dos Estudantes. Todos eram pessoas, cidadãos, e já estavam envolvidos em alguma frente de contestação da Ditadura Militar. Então, não foi uma coisa focal, foi por que estavam os sete estudantes na manifestação que eles resolveram prender os sete manifestantes, tanto é que eu posso falar pela minha pessoa tanto é de que quando um dos primeiros interrogatórios na Polícia Federal, quando estive presa, exatamente o que eu vi foram fotografias minhas e dos demais colegas, em várias manifestações estudantis, e isso prova de que eles estavam nos perseguindo sorrateiramente já fazia muitos anos, muito tempo, fazendo com que nós fossemos tratados como bode expiratório naquela ocasião específica.

Diego: Atualmente ainda tem repressão, ou melhorou?

Marize: Na verdade, o que a gente pode dizer é que houve uma grande contribuição, não só dos sete estudantes desse movimento, como também de outras pessoas, durante toda a jornada de luta política nesse país para que hoje tivéssemos liberdade democrática. Nós temos liberdade democrática? Temos liberdade democrática sim, na medida que podes se manifestar publicamente e sem necessariamente no outro dia saber onde é seu paradeiro. Na época, não sabíamos se sobreviveríamos na prisão. Atualmente, sabemos que as coisas não são desse jeito. Organizações já fundamentadas que podem proteger um cidadão quando ele está no caso após se manifestar, ser preso. Então, essa liberdade democrática existe, podemos dizer. Agora, se fores mais longe, vai questionar um pouco, vai dizer o seguinte: que liberdade é essa? Democrática, que se fala. E nós sabemos que o poder da mídia responde para o patrão, e hoje em dia, é o capital. E quando respondes para aquele que tem o capital na mão, ele só vai deixar as notícias saírem se forem direcionadas para um benefício do seu negócio. Então, a Rede Globo, hoje em dia, perfeitamente sabemos que as notícias que saem são de interesses da empresa, assim como os outros canais também. A Folha de São Paulo, que durante um certo tempo, foi um ícone na área do jornalismo, como defensora dos Direitos Humanos e Políticos, sabemos que hoje em dia defende as ideias e as transmite, veicula através do seu veículo, os assuntos que são do próprio interesse. Aquela que não vende jornal, não dá direito a marketing, oferece risco financeiro e econômico a ela, não são veiculadas. Então, isso é liberdade democrática? Continuamos a poder veicular aquilo que realmente é verdade. Então, através até da mídia eletrônica, vemos que as pessoas têm mais acesso a informação. A informação, ela consegue se contextualizar melhor, e por isso manifestar-se também.

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