quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Arruda na Gaiola

Arruda: ave nada rara por estas bandas.

De todas as aves que sobrevoam a riqueza de nossas florestas, o Corrupto é de longe a mais curiosa e indesejável. Passarinho safado e metido a esperto, não corre perigo de extinção porque nunca trabalhou pra valer e é dotado da capacidade de procriar-se aos milhões.

Parente próximo do Chupim, que adora ralar o bico no que é dos outros, o Corrupto possui o canto dos Quero-queros, pois sempre quer algo em troca de seus favores, e a voracidade de um Abutre-do-Coconote. Embora cultive hábitos alimentares variados, alimenta-se sobretudo de uma raçãozinha chamada propina.

É recomendável, para quem quiser pegar um Corrupto, que se use como isca, no alçapão, dinheiro em espécie — ou cash, como o bichinho gosta de ouvir. Muito cuidado na utilização de dólares ou euros, pois um Corrupto normalmente perde o controle ao ver dinheiro do primeiro mundo.

Mas não se preocupe se você não tiver numerário estrangeiro. De uns anos pra cá, os Corruptos estão tão corruptos que andam bicando até moeda nacional.
Sabe-se que o Corrupto nunca foi uma ave rara. Ao contrário, vive em toda a parte, em revoadas piores que as pragas do Egito, e nunca, mas nunca mesmo, ataca sozinho. Por isso a captura é tão fácil. Uma vez aprisionado o primeiro do bando, todo o resto pode ser encontrado em questão de semanas.

Se você é dado a caçadas, todavia, não se iluda com essa facilidade. É praticamente impossível manter um Corrupto no cativeiro.

Os corruptos proliferam na mata e, de uns tempos pra cá, passaram a se misturar com outras espécies. Há notícias de que foram vistos entre os Papagaios Traidores (PT), entre os Tucanos vaidosos, entre os Passarinhos Parasitas (PP), entre os vira-bostas DEMoníacos e entre a Patota dos Macucos Defensores da Barganha (PMDB).

Dotado de um terrível senso de oportunismo, o Corrupto se divide em três subgrupos essenciais. Além do Corruptus Marcus Valerium Dutum, que adora exercitar sua persuasão sobre pássaros de outras categorias, e o Corruptus Renaum Calheirum, famoso por acasalar-se com as mais cobiçadas fêmeas de sua estirpe, devemos destacar o Corruptus Arruda Brasiliensis, que costuma pedir desculpas depois de bicar a ração da passarada.

No momento, como se sabe, um belo exemplar do Corruptus Arruda Brasiliensis foi pego com o bico na botija. Algo me diz, entretanto, que alguém vai esquecer a porta da gaiola aberta.

Maicon Tenfen
Crônica publicada na de (17/02/2010)
do Jornal de Santa Catarina (Blumenau-SC).
Reprodução autorizada pelo autor

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